quarta-feira, julho 28, 2010

O fracasso da política externa de Lula

Jorge Castañeda, na Folha.com

A inércia geográfica, econômica e demográfica da América do Sul levou o Brasil a ter um papel de maior liderança do que antes. Isso aconteceria com ou sem o governo Lula. O fato de Lula estar fazendo um governo bom internamente faz com que o peso natural do Brasil se exerça de maneira mais clara na região.

Porém, tudo o que Lula tentou fazer fora do âmbito interno só resultou em fracassos. Tratou de obter um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU, não o obteve. Tratou de priorizar a Rodada Doha e não conseguiu nada. Tratou de ser um ator central para que se lograsse um acordo em Copenhague e não só não o alcançou como o Brasil em parte foi responsável para que isso não acontecesse. Tratou de se apresentar como protagonista num acordo nuclear com o Irã, mas sua mediação foi rechaçada pelo mundo inteiro, exceto pela Turquia e pelo próprio Irã.

Mas creio que mais importante é o fato de que Lula se absteve de mediar ou resolver conflitos que estão mais perto do Brasil. E há tantos. Os de Uruguai e Argentina, de Colômbia e Venezuela, de Peru e Chile, de Colômbia e Nicarágua, de Chile e Bolívia e o de Equador e Peru. Conflitos próximos abundam, e o Brasil não exerceu nenhuma liderança em nenhum desses casos.

Tampouco se apresentou para ajudar em problemas internos de outros países da América Latina. Salvo parcialmente no caso da Bolívia, e isso o fez para defender os interesses da Petrobras. Suas aspirações de potência mundial fracassaram, e ele não mostrou interesse de atuar como legítima potência regional. Lula coleciona fracassos e erros no âmbito externo.

segunda-feira, julho 26, 2010

Réquiem para um jornal humorístico

Do Millôr Online

Assim, depois de quatro anos de muitas e gargalhantes pelejas, algumas das quais foram acompanhadas alacremente pelo leitor, e outras das quais o leitor nem pode tomar conhecimento, O Pasquim chega ao número 200. Chega, não passa. Este é o último número do nosso jocoso semanário. Não é preciso que nossos amigos se embriaguem de alegria. Nem que nossos inimigos chorem. As coisas, como as pessoas, nascem, crescem e morrem, não é mesmo, Conselheiro? Só que O Pasquim nasceu às gargalhadas. Como todo o mundo viu, cresceu, diminuiu e cresceu de novo, sempre castigando os mores, e hoje morre, rindo às bandeiras despregadas. Pois morre vendendo saúde (100.000 exemplares) .

Morre atropelado. Uma força de alguns milhões de toneladas, uma teia de milhares de restrições e impedimenta, uma incalculável massa de obrigações e imposições, tornaram irrespirável a nossa já modesta ração de ar.

Dos seus quatro anos de hilariante vida, este zombeteiro hebdomadário pode contabilizar a glória de ter modificado fundamentalmente a linguagem dos outros jornais e ter influído muito na expressão falada da juventude e no estilo da comunicação publicitária.

Durante quatro anos, este risonho jornal cuja maioria de sorridentes redatores não é ligada a nenhum grupo político, econômico, religioso, nacional ou estrangeiro, que tem como único objetivo o exercício de uma crítica geral e democrática a tudo e a todos (os poderosos e estabelecidos sendo, naturalmente, os mais criticados, pois, não há graça nenhuma em criticar os caídos), foi combatido pela maioria dos grandes órgãos de imprensa brasileira e por todos os detentores de algum poder, inconformados com um veículo que não tinha preço de venda a não ser o da banca e era dirigido por intelectuais inatacáveis porque sem fichas pregressas que os situassem em qualquer esquema de ilegalidade ou qualquer espécie de criminalidade, mesmo fiscal.

Chegando a circular com um máximo de 64 e um mínimo de 16 páginas, o ridente PASQUIM conseguiu sobreviver a tudo, até mesmo à prisão de todos seus redatores, provada inútil pelas próprias autoridades num processo que foi a consagração deste grupo de profissionais, pois demonstrou que eles tinham como único e total objetivo de vida o exercício de sua apaixonante profissão.

A coação física não impossibilitou a saída do jornal. Durante dois meses, ele circulou sem a colaboração de qualquer dos seus redatores habituais. Sobreviveu graças à solidariedade de inúmeros colegas. Saiu fraco e sobreviveu mal. Mas sobreviveu com a barriga doendo de tanto rir.

Agora, porém, temos que nos render e afirmamos, humildemente, a nossa derrota definita, diante da única coação irresistível, a coação intelectual, hoje absoluta. Uma censura inconstitucional - a Constituição vigente é explícita quanto à liberdade plena de jornais e revistas circularem sem qualquer censura, os responsáveis respondendo, naturalmente, diante da lei, pelos desmandos que cometerem - já vinha sendo exercida de maneira sufocante. Jornais pobres, como este, resistiam debilmente, gastando 20 horas para refazer um trabalho anteriormente feito em 10 e tendo o dobro e, às vezes, o triplo de gastos para a confecção do material de suas folhas.

Coincidindo com o número 200, atingimos o limite das nossas possibilidades, fronteira natural de nossas ilimitadas impossibilidades. As poucas normas que ainda havia foram substituídas por um desvairo total das canetas pilotis, em que não há nem mesmo aquilo que se poderia exigir como último direito do cidadão - o respeito ao seu trabalho. Nosso trabalho, mesmo os nossos piores adversários reconhecem que o fazemos com conhecimento e seriedade. Trabalho de criação, único, pois artigos e desenhos humorísticos não podem ser substituídos de um momento para o outro como se fossem simples reproduções de discursos ou resenhas de acontecimentos sociais.

Mas o importante é que esta despedida não se alongue nem se transforme numa inútil exposição de motivos. E que, sobretudo, não seja triste. Só fechamos porque nos falta a competência da maleabilidade. Fechamos porque fechamos. O mundo não vai acabar. O Brasil vai continuar. Acontece que há momentos em que certos países não produzem determinados produtos que noutras épocas já produziram em abundância e que voltarão a produzir um dia.

Agora, parece, não é o momento propício para o plantio de facécias. Esperamos apenas que, daqui a cinqüenta anos, quando os especialistas estiverem saboreando os magníficos produtos satíricos de então, alguém se lembre de nos fazer justiça: "É, 73 não foi um bom ano para humorismo!"

sexta-feira, julho 23, 2010

Admirável Brasil novo

Crônica de Nelson Motta (via e-mail)

Estamos vivendo a alvorada de uma nova era no Brasil, com grandes transformações econômicas e sociais, gerando novos significados para velhas expressões. E até novos conceitos filosóficos, como “minto, logo, existo”, como foi comprovado nos depoimentos das CPIs.

Atualmente, os empresários não querem mais ter lucro, eles só trabalham para gerar empregos. Os bancos e grandes empresas só pensam em salvar o planeta, pela sustentabilidade. As organizações não-governamentais são sustentadas pelo governo. Só falta o almoço grátis.

Modernizamos até mesmo provérbios universais consagrados pela sabedoria popular. As apavorantes galerias de fotos de nossas casas legislativas são o desmentido cabal de que as aparências enganam. Nas Comissões de Ética, ladrão que julga ladrão dá cem anos de perdão, e é mais fácil o Marcelo Camelo passar pelo buraco de uma agulha do que o STF condenar um parlamentar. Aqui se faz e aqui se apaga. No Brasil, o ladrão faz a ocasião, com emendas parlamentares e contribuições de campanha. Porque a liberdade deles começa onde termina a nossa.

Neste país, quem dá (dinheiro público) aos pobres, empresta aos seus, naturalmente eleitores. Contra fatos não há argumentos, só bons advogados e lobistas eficientes. Macacos velhos têm suas cumbucas em paraísos fiscais, dinheiro sujo não se lava em casa. São partidos, partidos, negócios à parte - a parte de cada um no negócio. Afinal, tudo vale a pena se a multa é pequena.

Como se vê no noticiário político, mentir e coçar é só começar, conversa mole tanto bate até que cola, e CPI que é ladra não morde. Quem não mama, chora. Aqui, o barato não sai caro, no Senado sai de graça. O segredo é a lama do negócio.

No Brasil, tristezas não pagam dívidas de campanha, quando um burro fala os outros aplaudem, os cães ladram e a caravana é assaltada, e quando um não quer dois não roubam, chamam mais gente: os meios justificam os afins.

Aqui se dá a Lula o que é de Deus e a César, talvez, o Senado, porque Lula é a voz do povo e dá a bolsa conforme o eleitor. O príncipe é o sapo. Só espero que quem o voto fere, pelo voto seja ferido.