domingo, julho 03, 2011

A raiva na internet ou desabafo da 'lôraburra'

Martha Mendonça, editora-assistente da revista Época

Um dos assuntos da semana foi o vídeo de Chico Buarque falando de como as pessoas são raivosas na Internet. O compositor, que está em processo de divulgação de seu novo disco, diz que, até começar a ler o que se falava sobre ele na rede, acreditava que era amado. As pessoas sempre foram aos seus shows, cantavam, aplaudiam, o cumprimentavam nas ruas. Gostam de mim, imaginou. Mas a curiosidade o levou a querer saber o que mais se dizia dele. “Descobri que na verdade sou odiado”. Na internet, era chamado de velho, ultrapassado, bêbado. Sempre com raiva. Muita raiva.

Na semana passada, o roteirista de humor e ator Bruno Mazzeo foi ao Programa do Jô e falou de assunto semelhante. Comentou sobre “a raiva na internet”. No Twitter, ele é xingado, rotulado, achincalhado. Explicou que não consegue deixar de responder a algumas coisas – embora saiba que o melhor mesmo é ignorar.

Não somos famosas como Chico e Bruno. Mas aqui no Mulher 7×7 também sofremos com a “raiva na internet”. É algo de que qualquer pessoa que tenha site, blog ou conta em rede social e é minimamente lido não escapa.

Não está fácil colocar a cara na internet.

Outro dia, escrevi um post no smartphone, com pressa. Depois publiquei – e tinha erros de digitação. Foi um alvoroço. Em vez de comentarem o assunto polêmico do post, os comentários focavam nos meus erros. Como a editora-assistente da revista Época poderia errar assim? Que profissional negligente! Não eram erros de português, mas claramente de digitação. Claro que estamos aqui para buscar a perfeição. O leitor merece todo nosso cuidado. Mas aconteceu. Acontece. Bastaria um comentário educado: olá, o texto está com erros de digitação, dê uma olhadinha, blogueira. É ótimo sentir a cooperação dos leitores.

Mas não. É preciso agredir. É preciso colocar a “raiva na internet” pra fora.

Até agora estamos falando de forma. Quando é caso de conteúdo, a coisa sobe a níveis altíssimos. Opiniões não podem ser apenas confrontadas. O dono delas precisa ser pisado, massacrado.

Como assim aquela pessoa que tem uma opinião diferente da sua tem um espaço importante na rede e você não?? Que assunto ridículo, caro blogueiro, não tem nenhuma tema melhor, não?? E dá-lhe ofensa! Tudo, claro, quase sempre protegido pelo anonimato. Ah, o anonimato! Nada como ser uma voz solta no ar, sem rosto, sem identificação!

Se puder tecer considerações negativas a respeito da aparência de quem escreve, melhor. Perdi a conta de quantas vezes fui chamada de “lôraburra” nos comentários – no último deles, me chamando de… “preconceituosa”. Digamos que eu tivesse sido mesmo. Mas e o preconceito contra as louras? No mesmo post, outro leitor também disse que eu estava sendo preconceituosa e acrescentou que eu tinha… “cara de síndrome de down”.

???

Li um tweet ontem, do humorista Murilo Gun: “Casal de lésbicas veio reclamar de uma piada minha. No show, elas riram de piadas sobre gordos e nordestinos. Mas quando as atinge não tem graça”.

Quase todo mundo é assim. O gordo ri do anão, o anão ri no negro, o negro ri do gay, o gay ri do nordestino, o nordestino ri da loura, a loura ri do feio, o feio ri do deficiente, o deficiente ri do gordo…

(E por falar em humorista, humor é algo que muitos não entendem. Tomam tudo ao pé da letra. Toda essa patrulha tem razão de ser, é um sinal de que estamos desenvolvendo o respeito aos direitos humanos. O exagero faz o mundo ficar muito chato – mas acredito que daqui a pouco as coisas vão se equilibrar.)

Tudo que eu disse aqui, talvez misturando alguns canais, em tom de desabafo, exclui totalmente o leitor/comentarista que discorda de alguma coisa que dissemos – com elegância. Esse é o melhor. O que concorda é igualmente bem-vindo, claro (afinal, concordar ainda é possível!). Mas o que contra-argumenta é o motor das discussões educadas e inteligentes.

Portanto, se for o caso, discordem de tudo que eu disse acima – mas sem raiva, por favor.